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"ICCAT: Reunião Especial nem tão Especial assim!"

23ª Reunião Especial da Comissão Internacional para Conservação do Atum do Atlântico

Nem tão especial assim!

Terminou, nesta última segunda-feira, dia 21 de novembro, em Loulé - Portugal, a Reunião Especial da ICCAT de 2022. O Brasil, como já citado em nosso site em artigos anteriores, esteve muito bem representado e teve seu trabalho devidamente reconhecido.

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Terminou, nesta última segunda-feira, dia 21 de novembro, em Loulé - Portugal, a Reunião Especial da ICCAT de 2022. O Brasil, como já citado em nosso site em artigos anteriores, esteve muito bem representado e teve seu trabalho devidamente reconhecido.


Um dos tópicos que merece destaque é a situação do Brasil como membro da Comissão, pois devemos encontrar caminhos, se possível ainda no atual mandato, de quitar nossas obrigações financeiras com a ICCAT. As situações financeiras dos países membros da Comissão são tratadas dentro do Comitê Permanente de Administração e Finanças (Standing Committee on Finance and Administration – STACFAD). Após grande esforço político e orçamentário nossa Delegação Brasileira chegou em Portugal, pendentes apenas da anuidade de 2022, devida até 31 de dezembro, que, considerando situações pretéritas, deixa o país em uma posição razoável, pois já chegamos, em um passado não muito distante, a estar com mais de 3 anuidades atrasadas, o que é vexaminoso e tira força de argumentação. Em momento de mudanças administrativas, um ponto importante de ser trazido ao planejamento e estruturação são os esforços da atual administração da Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – SAP/MAPA e sua interlocução interna junto à Secretaria de Comércio e Relações Internacionais – SCRI, e do MAPA e externa junto ao Ministério da Economia – ME, para buscar providências de desembolso e atenção às obrigações devidas.


No que se refere ao Comitê de Cumprimento das Medidas de Conservação e Ordenamento – (Compliance Committee – COC), o Brasil, através da SAP/MAPA, mesmo com todas as dificuldades de estrutura, improvisos e pequeníssimos atrasos, conseguiu, com a usual dedicação de cientistas já destacada anteriormente, atender satisfatoriamente a entrega das tarefas e informações que alimentam o banco de dados da ICCAT, municiando-os a fazer a melhor gestão dos estoques sob sua responsabilidade. Nesse sentido, nós produtores, precisamos colaborar na entrega destas informações e cumprimento de nossas obrigações concessionárias, como a entrega em dia dos mapas de bordo e mapas de produção, e entender que, as deliberações da Comissão devem ser internalizadas e transformadas em normas de ordenamento que sejam monitoradas e fiscalizadas.


É importante destacar que nossos balanços de cotas e limites de captura estão descompensados para algumas espécies. Estamos capturando menos do que podemos de Espadarte/Meca (Xiphias gladius – SWO) e de Albacora-branca (Thunnus alalunga – ALB), o que nos deixa suscetíveis a que estes saldos sejam, eventualmente, realocados. E ATENÇÃO: por dois anos seguidos extrapolamos nosso limite de captura de Albacora-bandolim (Thunnus obesus – BET) e temos, portanto, um débito de quase 800 ton. a contabilizar e compensar do nosso limite, que hoje é de aproximadamente 6.000 ton. Considerando as difíceis discussões nas últimas reuniões, o fracasso de negociarmos uma alocação formal das cotas da Albacora-bandolim – BET, e a íntima relação entre esta espécie e a Albacora-laje (Thunnus albacares – YFT), devemos estar preparados para encarar com muita seriedade e espírito construtivo as próximas discussões, que decidirão o futuro da atividade. Detalharemos mais abaixo.

O ordenamento da atividade pesqueira das espécies sobre responsabilidade da ICCAT está estruturado dentro de quatro Painéis, a saber:


P1: Atuns do Atlântico Tropical: Albacora-laje (Thunnus albacares – YFT); Albacora-bandolim (Thunnus alalunga – ALB); e Bonito-listrado (Katsuwonus pelamis – SKJ).


P2: Atuns do Atlântico Temperado Norte: Atum-azul (Thunnus thynnus – BTF); e Albacora-branca – populações do norte e do mediterrâneo (Thunnus alalunga – ALB).


P3: Atuns do Atlântico Temperado Sul: Atum-azul (Thunnus maccoyii – SBF); e Albacora-branca – população sul (Thunnus alalunga – ALB).


P4: Pequenos Atuns e Espécies Associadas – Albacoras; Bonitos; Peixes de Bico; Meca (Xiphias gladius – SWO); e Cações Oceânicos.


Conforme nossa primeira publicação sobre esta Reunião, a grande expectativa para o Painel 1 era a definitiva aprovação de uma tabela de alocação de cotas de captura para os países usuários da Albacora-bandolim – BET. Essa espécie há alguns anos vem sendo apontada como sobrepescada, o que significa que sua biomassa está abaixo do limite sustentável e que a o mesmo acontece com a biomassa reprodutiva, levando a um declínio da população. Em 2016, o Limite Total de Captura (Total Allowable Catch – TAC) para a espécies foi estabelecido em 61.500 ton., o que é considerado um nível bastante conservador, mas a reavaliação do estoque, novas constatações biológicas e adequação de modelos, apontam para uma situação um pouco mais confortável, que indica uma biomassa ainda não ideal mas com sua parcela de biomassa em reprodução em melhores condições, remetendo a uma recuperação da biomassa e uma confortável condição de repensar TACs em níveis mais generosos.


A grande dificuldade é alcançar um acordo entre os países, pois ainda prevalecem divergência sobre como repartir estes limites e como alocar este excedente entre as partes contratantes da Comissão. Uma das premissas para a repartição das cotas é o sempre predominante histórico de capturas, que na realidade trata-se de um modelo evidentemente insustentável, pois prevalece sempre o grupo dos grandes produtores e não abre oportunidades equilibradas para países em desenvolvimento. Embora já existam deliberações que apontem para um ajuste na equação das alocações e das oportunidades de pesca que considerem e priorizem os estados costeiros, em desenvolvimento e com predominância de pesca de menor escala, os países dominantes não cedem e firmam posições pensando e defendendo situações individualistas e até certo ponto colonialistas.


É importante destacar que por trás de propostas e do comportamento de representantes de certos países e, até da direção do painel, estão interesses financeiros, corporativos e geopolíticos de suas dependências e, claramente, a não alocação de cotas reflete um grande fracasso deste P1. A solução encontrada foi postergar uma medida frágil, de estabelecer compromissos de não aumento de captura a países, que um último momento quase caiu por terra, o que deixaria esta espécie sem recomendação alguma, em natural absurdo gerencial. A atuação brasileira, em intervenção equilibrada e emocional, já nos momentos finais da plenária de fechamento, foi capaz de sensibilizar o Senegal, que ameaçava se opor a postergação acordada.


Uma aprovação bastante positiva no P1, foi de uma proposta brasileira pelo aceite e início de trabalhos e esforços da ICCAT na busca da adequação do ordenamento da população oeste do Bonito-Listrado do Atlântico, nosso Gaiado. O objetivo é um ordenamento que leve em consideração uma Avalição Estratégica – MSE (Management Strategy Evaluation). Em seguida, traremos um maior detalhamento desta estratégia, com a formalização dos indicativos a serem considerados e ponderados e os mecanismos de maior garantia da sustentabilidade deste estoque, que, ao que tudo aponta, está em excepcionais condições de conservação.


Já o Painel 2, que cuida do icônico Atum-azul do Atlântico – BFT, conduzido com muita competência e objetividade, teve sucesso na alocação, mesmo que temporária, de

excedentes à cota anterior estabelecida, permitido por uma recuperação da biomassa e dos parâmetros populacionais, um sucesso de gestão que merece elogios e que deve ser exemplo a própria ICCAT e a outras pescarias.


Apesar do sucesso é importante esclarecer que não foi simples pois nas discussões de como repartir este excedente também aconteceram diálogos dispersivos e uso de argumentos absurdos, que colocam em xeque tantos discursos de grandes potências e economias em Fóruns Internacionais, evidenciando a grande diferença entre discursos e ações. Vimos países em delicada situação socioeconômica, do norte da África e do Leste Europeu, em evidente desvantagem política, social e econômica, mas com todo direito ao uso de recursos que migram em suas Zonas Econômicas Exclusivas – ZEE, serem contrapostos por posições insustentáveis e claramente desiquilibradas. Por fim a condução e a pressão por parte da direção do Painel de que, na falta de um acordo nenhum excedente seria alocado, conduziu a um aceite temporário da proposta.


Outro grande ponto, há muito pretendido e finalmente alcançado, foi a entrada em vigor de um sistema de gestão muito mais sensível e precautório: o Ordenamento com Avalição Estratégica – MSE. Essa estratégia se dá com base em indicadores e regras que antecipam as condições de tomada de decisões e caminhos de gestão, protegendo mais os recursos e garantido uma melhor sustentabilidade da atividade pesqueira. Este sistema e experiência certamente servirão para catalisar as ferramentas e ponderações pretendidas para o Bonito-listrado do Atlântico Oeste, conforme citado no parágrafo do P1.


O Painel 3, conduzido em ambiente menos pressionado por tratar de recursos sob boa condição populacional e menor número de partes interessadas, não trouxe surpresas e correu de forma bastante harmoniosa. Devemos atentar, entretanto, que temos cota alocada para a captura da Albacora-branca, herança de tempos de elevadas capturas históricas promovidas, principalmente, por embarcações arrendadas, especializadas em operações em águas mais profundas e com uma armação diferenciada de seus espinhéis, que tinham especial foco nesta espécie. Mesmo que ainda não exista pressão neste momento, reestabelecer capturas a níveis mais altos e próximos da nossa cota já determinada é uma gestão que deve ser procurada, como garantia de manutenção desta privilegiada posição na alocação das cotas.


O Painel 4 tinha no ordenamento dos Cações Oceânicos o seu maior desafio visto que o Tubarão-anequim/Mako do Atlântico Sul (Isurus oxyrinchus – SMA) sofria pressão para ter medidas restritivas já estabelecidas para a população do Atlântico Norte. Essa situação acabou acontecendo através de uma recomendação confusa de retenção parcial autorizada, regra que certamente será de difícil internalização. Essa espécie já possui dificuldades no país, principalmente no âmbito dos Certificados que devem ser desenvolvidos pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, além disso, também é uma espécie que, em discussões na Comissão Nacional da Biodiversidade – CONABIO, foi inserida na Lista de Espécies Ameaçadas, o que levará a uma transferência da gestão e ordenamento de sua exploração para o Ministério do Meio Ambiente – MMA.


Concomitantemente à Reunião da ICCAT, acontecia no Panamá a reunião da Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies Silvestres Ameaçadas de Extinção – CITES, onde aconteceram discussões sobre a inclusão de toda a família Carcharhinidae no Anexo II, incluindo o Tubarão-azul (Prionace glauca – BSH). Essa inclusão impõe regras comerciais bem mais exigentes e burocráticas, dependentes, na maioria das vezes, de órgãos governamentais ambientalistas e de viés conservador, o que, sem dúvida, atrapalha o trâmite comercial estabelecido. O Brasil é grande consumidor e importador desta espécie, e deve-se prever fortes reajustes nas cadeias comerciais envolvidas. Ainda na Reunião da CITES, foi aprovada a inclusão de outros cações e raias neste Anexo II, como raias-violas e raias de água doce com uso para aquariofilia, que terão certamente implicações significativas quando internalizadas e aplicadas em fiscalizações e trâmites administrativos comerciais.


Voltando ao Painel 4, uma esperada medida de obrigatoriedade de desembarque de tubarões com as nadadeiras naturalmente presas ao corpo dos animais não foi alcançada, a principal argumentação partindo de países asiáticos, de dificuldades operacionais, pois são usuários de embarcações com super congelamento (-60 ºC) e alegam não ser possível, em descarga, promover o descongelamento parcial para corte das nadadeiras. Vale destacar que no Brasil, esta já é uma medida regulamentada, sendo proibido o corte antes do desembarque, evitando a possibilidade do “finning”, prática de cortar e reter somente as nadadeiras e descartar o corpo dos animais.


Também no P4, considerando indicativos de diminuição de biomassa da Meca do Atlântico Sul, a Comissão decidiu por uma redução do TAC de 14.000 para 10.000 ton., o que não afeta, ainda, a tabela de alocação de cotas de captura aos países nela colocados, mas é um claro indicativo de risco para aqueles que, possuidores de direitos de pesca, não estejam o exercendo, diminuindo, portanto, sua participação histórica e aumentando o risco de, em possível realocação futura, tenhamos esta cota reduzida.

Estas são, caros filiados, setor e leitores, os nossos principais apontamentos e percepções desta 23ª Reunião Especial da ICCAT. Destacamos novamente a solidez em número e conteúdo da delegação brasileira, o governo, com o Secretário de Aquicultura e Pesca como Chefe de Delegação, teve a sensibilidade de dar tempo e capacidade de preparação para sua Assessora Internacional, Natali Picollo, que com muita personalidade, autonomia, permeabilidade e transparência, conduziu de forma serena e ponderada, e firme quando necessário, o posicionamento nacional. Cientistas brilhantes e colaborativos sempre sustentando tomada de posição e um setor interessado, ali representado por este Conepe, pelo SINDIPI-SC, SINDIPESCA-RN e SINDFRIO-CE, além da ABIPESCA, na condição de observador independente. Este grupo e a atividade atuneira brasileira saem da reunião com muito trabalho a fazer e a ser absorvido por todos os brasileiros direta e indiretamente ligados a estes recursos pesqueiros. Precisaremos união, força e visão estratégica para seguir utilizando da riqueza destes recursos em atendimento às regras e institucionalidades da Comissão Internacional para a Conservação do Atum do Atlântico – ICCAT.






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